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domingo, 20 de maio de 2012

Coluna "Anotações da minha mãe"

Da redação do +CASINHAS.COM

charlesnasci@yahoo.com.br

A partir de hoje, como prometi, o Blog abre espaço para divulgar as "anotações da minha mãe". Um quadro semanal dedicado aos escritos de Maria Borges de Lima, minha genitora. Na estreia, marcada pela data do seu aniversário, confira a 1ª parte de uma crônica intitulada "Vida vivida", onde ela descreve com riqueza de detalhes uma série de lembranças da sua infância e juventude. Boa leitura! 

Vida vivida - Parte I

Por Maria Borges de Lima*

Inesquecíveis recordações da minha infância, do meu lugar, a comunidade do Diogo, no município de Casinhas... Sei que talvez ninguém esteja interessado em querer saber disso, mas mesmo assim, a pedido do meu filho, vou contar... só um pouquinho. Eu sou natural da Paraíba, onde nasci e lá vivi um 'pedacinho' da minha vida. Depois vim morar em Surubim, no estado e Pernambuco, onde também vivi outro 'pedacinho'. Em seguida, cheguei no 'antigo' Diogo – 'antigo', porque na época a paisagem era outra e, hoje, tudo mudou. 

Antes o que existia era uma 'buêra' – era mesmo assim que se chamava a passagem molhada na época – e, com o passar do tempo, colocaram três tubos por onde a água passava, mas sempre que havia alguma 'cheia' – era assim que a gente chamava as enchentes –, os lixos e os 'munturos' que as águas arrastavam rio abaixo entupiam e tapavam os tubos; o nível da água subia até represar e cobrir a 'buêra'. Neste momento era um 'deus nos acuda' porque a água invadia os quintais, as 'vagens', os sítios e... as granjas. 

Lembro-me, parece que foi hoje, que houve uma grande enchente, que chegou a arrastar alguns homens e a invadir uma granja da comunidade. Essa granja pertencia ao senhor Nezinho, já falecido. A 'buêra' ficava na parte mais baixa da comunidade e, ao seu lado, havia uma grande pedra e um lindo 'pé de juá'. Me lembro que minha mãe e meu pai criavam porcos e, como a cheia chegava de repente, muitas vezes não dava tempo de salvá-los. Então, ia embora porco, galinha, tudo. A gente via também cavalo e boi sendo arrastado pelas águas. 

Mas, voltando à granja de 'seu Nezinho', imaginem a cena: de repente, pra onde a gente olhava na direção do rio só via aquilo tudo branco. Eu tinha um irmão chamado Paulinho, que já faleceu. Lembro que ele foi o primeiro morador a pegar um saco e correr pra 'buêra' pra 'pescar galinha'; ele ainda chegou a 'apanhar' uns três sacos, apesar de termos sentido muito a perda que foi pra 'seu Nezinho'. Mas foi irresistível ver tanta galinha boiando rio abaixo – elas estavam frescas e se debatiam muito – e não tentar salvar alguma pra... vocês sabem! 

Nesse dia muitos moradores pegaram galinha; lembro da minha mãe, dona Nêm, depenando, limpando, salgando e pendurando a carne em uma corda, sob o sol, no outro dia. A enchente foi embora e deixou tristeza pra duas famílias da comunidade, que choraram a morte por afogamento, dos senhores Manoel Paulino e "Nêgo Véio". Agora, verdade seja dita: pra muita gente foi só alegria passar umas quatro semanas saboreando galinha na brasa, com fava, 'sabonga' e farinha de milho. (Continua na próxima semana)

*Maria Borges de Lima é mãe do blogueiro e, a partir de hoje, e sempre aos domingos, passa a assinar uma coluna de crônicas aqui no Blog